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Programas Esportivos: Não está ruim, mas está chato.


Desde que me entendo por ser humano capaz de tomar decisões, isso aconteceu por volta dos meus 7 anos, minha rotina é pautada por programas esportivos. No colégio, eu voltava correndo para pegar o Globo Esporte na hora do almoço, e então iniciava um revezamento entre ESPN e SporTV até o final da tarde, hora da Gazeta Esportiva, e então voltava para ESPN para o Sportcenter. Há mais de 20 anos sou um consumidor regular da programação esportiva nacional e por isso me estranha o fato de hoje, aos 31, não conseguir mais assisti-la.


Nos últimos anos, a televisão como um todo sofreu com a evolução da internet, e os canais de esportes não foram exceção. Começou pela obsessão com as redes sociais, o novo termômetro de popularidade, obsessão essa que acabou se tornando submissão - programas pautados pelos assuntos do momento. Me espanta que uma foto do Neymar com a camisa do Flamengo possa gerar 40 minutos de debate sobre se Neymar jogaria ou não no Flamengo. Me espanta que um programa de jornalismo (jornalismo esportivo é, afinal, jornalismo) dê atenção a coisas como o que um jogador dá like, ou “notícias” sem pé nem cabeça, as famosas transferências bombásticas, que surgem e desaparecem em um dia, justamente por não ter fundamentos.


Sei que, quanto à isso, é um mal dos tempos: a partir do momento que qualquer um pode criar conteúdo, basta um irresponsável em busca de likes soltar uma fake news sobre a venda de um jogador para esse assunto explodir, e aí os programas esportivos se veem obrigados a tocar no assunto. No entanto, esse tocar no assunto deveria ser “investigamos as informações, falamos com nossas fontes, e essa notícia não tem nenhum fundamento. Próximo tópico”, e não mais uma hora de debate alimentando a fantasia. Eu sei que fantasia dá audiência, mas devemos sempre partir do principio da qualidade da informação, não da popularidade dela.


Outra questão é a morte das reportagens. É difícil lembrar a última vez que vi uma matéria gravada num canal esportivo. Hoje, é tudo ao vivo o tempo todo e, mais do que isso, sempre programas de debate. As mesas redondas, que eram os programas que esperávamos a semana para ver (no final do domingo ou Bate Bola e Bem Amigos na segunda), hoje estão 24 horas no ar. Mesmo o Sportcenter, um programa famoso pelas matérias, hoje é praticamente mais um programa de debates. O que é uma pena, porque a ESPN já fez matérias muito legais. Na Copa de 2018, por exemplo, o jornalista Mendel Bydlowski fez uma série de reportagens bárbaras na Rússia - me lembro de três que me marcaram: uma em Chernobyl, outra sobre um cachorro que esperou os donos na beira da estrada até morrer e outra numa cidade fantasma russa. Isso parece não existir mais. Em qualquer momento que você ligar em qualquer canal esportivo, se não estiver passando o jogo, está passando a tela dividida em 4, com jornalistas discutindo. Para mim, o problema é que isso enjoa. Mesmo trabalhando em casa, não consigo mais deixar a televisão o dia inteiro num canal esportivo porque dá a impressão que estou vendo sempre o mesmo programa.


Seguindo com meu desabafo, há também a relação dos jornalistas com as redes sociais. É apenas uma impressão, porque não os conheço pessoalmente para afirmar qualquer coisa, mas, enquanto telespectador, sinto que há profissionais que não conseguem falar na televisão sem deixar de pensar no número de seguidores no celular. Ou ainda, e isso é um problema mais sério e mais antigo, profissionais que evitam críticas contundentes para não se queimar com atletas, diretores ou determinada torcida. É raro ouvir alguém dizer ao vivo que determinado jogador foi péssimo na partida. Ao invés disso, há todo um dicionário para as críticas educadas: jogador deixou a desejar, rendeu um pouquinho abaixo, noite infeliz, entre tantas outras. Inevitavelmente, soa falso. E gera também uma outra impressão: de que aos poucos, independente da história e credibilidade, profissionais são afastados dos canais por não se enquadrar neste nova forma de fazer televisão.


Importante lembrar, aliás, que a intenção deste texto não é criticar jornalistas esportivos. Todas essas questões envolvem uma mudança de formato na programação, e mudanças deste tipo vem de cima - os profissionais que aparecem na tela estão seguindo decisões feitas fora dela. Daí minha curiosidade. Gostaria de saber se esse formato, que me desagrada, realmente funciona. Será uma questão de idade? Digo, eu tenho 30, mas meninos e meninas de 15 ou 20 preferem este novo jeito? Para mim, uma pessoa que não consome redes sociais frenéticamente, que não segue atletas e que nunca sei qual é o meme ou a música da moda, as vezes me sinto completamente alheio ao que está passando na tela. E tudo que eu queria era saber como foi o treino do Palmeiras.

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